16 de abril
Evangelho - Jo 6,1-15
Evangelho de Jesus Cristo, segundo João (Jo 6,1-15)
Neste Evangelho Jesus nos propõe uma lógica de partilha. Os discípulos de Jesus são convidados a reconhecer que os bens são um dom de Deus para todos os homens e que pertencem a todos; são convidados a quebrar a lógica do açambarcamento egoísta dos bens e a pôr os dons de Deus ao serviço de todos. Como resultado, não se obtém apenas a saciedade dos que têm fome, mas um novo relacionamento fraterno entre quem dá e quem recebe, feito de reconhecimento e harmonia que enriquece ambos e é o pressuposto de uma nova ordem, de um novo relacionamento entre os homens. É esta a proposta de Deus; e é disto que os discípulos são chamados a dar testemunho.
A medicina da imortalidade
Poderíamos neste domingo recordar que Jesus põe em nossas mãos a responsabilidade ante a fome do mundo: "lhes dê o de comer!". Porém bem sabe Jesus que essa missão é uma “missão impossível”. Ele reconhece isto quando disse: “Porquanto os pobres sempre os tendes convosco; a mim, porém, nem sempre me tendes” (Mt 26,11).
O que podemos oferecer ao mais necessitado para saciar sua fome será sempre insuficiente. É verdade que "outro mundo é possível", mas a realidade obstinada nos mostra que não se passa a vida gritando por essa mudança, mostrando sua viabilidade, porém as coisas não mudam. Não obstante, estas palavras de Jesus: "lhes dê o que comer!" não podem ser lançado ao esquecimento, quando ao nosso lado há tantas pessoas com necessidades que pedem ajuda, alimento.
Ante a intranqüilidade dos discípulos que mostram a melhor disposição, Jesus oferece sua solução. Faz do “pouco” alimento, alimento para “todos”; faz que o pão desta terra, que logo endurece e se torna inútil, se converte em “pão da vida”, em “alimento de salvação”, no “pão de cada dia” concedido pelo Abbá e que leva o selo -a marca- do céu.
É admirável constatar que Jesus não humilha quem pode oferecer algo; tão pouco despreza o alimento “terreno”, nem o rejeita, para colocar sobre a mesa um alimento “celestialmente puro”. Não! Tanto na multiplicação dos pães, como na ultima Ceia -dois relatos que nos falam o mesmo!- Jesus se serve do pão da terra, do pão produzido por mãos humanas, Ele não quer estabelecer descontinuidade, ruptura. O pão é "transubstanciado" (assim tem expressado nossa mãe Igreja em sua tradição), se converte em uma realidade transcendente, capaz do impossível. O que tem limites se torna ilimitado; aquilo que está localizado se torna capaz de onipresença, o que somente alimenta o corpo é capaz de produzir uma revolução vital, isto é, “ressurreição dos mortos”.
Santo Inácio de Antioquia chamou o pão eucarístico e o vinho eucarístico “fármaco da imortalidade”, ou medicina da imortalidade. Os seres humanos têm buscado muitas vezes o elixir ou poção da eterna juventude. O fato é que nosso corpo se deteriora, adoece, envelhece e morre. “O sonho dos sonhos”. Será o pão da vida, o pão eucarístico, um sonho? Será sinal de um desejo de imortalidade que não pode se realizar? Falaria Inácio de Antioquia simplesmente como chave poética?
A verdade é que muitos de nós quando nos aproximamos para receber o pão eucarístico, a comunhão, não o fazemos com a mesma fé com que tantas pessoas se aproximam de um curandeiro, quando recebem uma mensagem “milagrosa” ou tomam uma dose de um medicamento que parece muito efetivo. A verdade é que muitos se aproximam para comungar como quem vai beber um copo de água, porém sem sede. Dá a impressão que a comunhão do pão eucarístico, “corpo de Jesus”, se torna banal, ritualista, um gesto como aquele de paz ou de saudação mutua.
O mais chocante é que na hora de expressar que há significado para os crentes a participação na Eucaristia, poucas vezes se faz referencia ao recebimento do “medicamento da imortalidade” e quase sempre se expressa que existe significado somente ao bem-estar no meio da comunidade, as palavras da homilia, a beleza dos ritos e cantos.
Quem assistiu a multiplicação dos pães, sem dúvida sentiu que aquele pão, tocado pela mão de Deus -Jesus- e símbolo-presença de suas palavras poderosas, os encheu de vitalidade, de futuro.
Aquela massa anônima de pessoas, que eram como ovelhas sem pastor, sentiram a força extraordinária que os unificou em um único propósito: fazer de Jesus seu Pastor, seu Rei! O pão os converteu em povo. Fez renascer o povo, antes morto.
Porém, o pão de Jesus, é um presente, um dom, que não se compreende imediatamente. É necessário percorrer um caminho com Jesus. É um pão “misterioso”. Quando se dão conta do que comporta, muitos renunciarão ao comê-lo e outros sentirão necessidade de sentarem-se todos os dias à mesa e de evocá-lo muitas vezes durante o dia. Pois, esse pão, tem muito que ver com o Amor, com a Aliança... Nos próximos domingos assistiremos a esta catequese eucarística de Jesus.
E neste domingo? Podemos resumi-lo em quatro pontos:
Não comungues se não sentes necessidade do Pão que vem das mãos de Jesus. Se te sentes enamorado de Jesus e de seu Evangelho, se te reconheces como sendo pobre, faminto, demasiado deprimido, se não tens ilusões, se te sentes como parte de um povo enlouquecido, então sim: acolhe em tuas mãos o Pão da Vida;
Comunga com uma atitude de grande estremecimento e humildade e envolto de agradecimento: "oh Senhor, não sou digno”. O pão da terra e do céu queima, transforma, transubstancia. É uma semente de vida divina; receberás uma moral muito alta para afrontar os questionamentos de cada dia, pessoais e políticos.
A medicina da imortalidade que você recebe quando comunga, produz efeito durante muito tempo: se faz eterno tudo o que mais queres amas, desfruta; é a medicina do amor que nunca morre. É uma medicina que faz com que a morte já não cause feridas. Transforma a morte em ressurreição e a separação em outra forma misteriosa de comunhão. A comunhão vai curando pouco a pouco todas as nossas feridas. Porque tocar na borda do manto de Jesus é tão benéfico para a saúde (o hemorroísa!), o que não será tocar corpo do Senhor?
Quem recebe o pão das mãos de Jesus, faz com que suas mãos se convertam também em mãos eucarísticas, que dão o pão de cada dia aos famintos. Quem comunga escuta ao mesmo tempo as palavras de Jesus: "lhes dê o de comer!". Desse modo, nos convertemos em terapeutas de nossos irmãos.
José Cristo Rey Garcia Paredes
CONCLUSÃO
O capítulo sexto do evangelho de São João é reservado para o discurso sobre o sacramento da Eucaristia, e Jesus, no uso da sua pedagogia, prepara os judeus para esse discurso através da multiplicação dos pães. A prática pedagógica de Jesus deve ser o grande iluminativo para a nossa prática missionária, pastoral e evangelizadora. Nós devemos anunciar o evangelho a partir da realidade das pessoas, de suas experiências de vida, dos seus valores e das suas expectativas. Antes de anunciar a Palavra de Deus, precisamos criar a necessidade dela no coração das pessoas como Jesus, que a partir da necessidade do pão, cria a necessidade do pão da vida eterna.
(Conferência Nacional dos Bispos do Brasil)
Nenhum comentário:
Postar um comentário