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26 de ago. de 2010

Agosto(27-sexta)2010 - Prof. Fernando

Agosto(27-sexta)2010 Santa Mônica, mãe de S.Agostinho Comentário à 1ª Leitura

(21ªsemana T.Comum - 22 a 28 agosto ( http://liturgiadiariacomentada.blogspot.com/

1Cor 1,17-25 ocasião de tropeço (ou) estupidez mas, para os chamados: poder e sabedoria de Deus.

[Evangelho O noivo está chegando. Ide ao seu encontro.Mateus 25,1-13 ]

Para a comunidade de Corinto, dividida em “partidos”: cada grupo se achando melhor que o outro pela origem (em relação a quem foi seu “gurú” para a fé: Apolo? Pedro? Paulo?...) Paulo mostra que a proclamação do evangelho não depende de uma segurança prévia que condicione a aceitação da fé.

Essa “garantia prévia” seria, para alguns, “provas” atestadas por milagres dentro de uma perspectiva religiosa (que sinal nos apresentas tu, para procederes deste modo? (João 2,18); Esta geração adúltera e perversa pede um sinal, mas não lhe será dado outro sinal do que aquele do profeta Jonas (Mt12,39). Para outros seriam “provas” lógicas de um discurso racional ou filosófico dentro de uma perspectiva da inteligência, chamada em geral, no oriente antigo de Sabedoria..

Paulo se entende como um arauto, aquele que proclama a Boa Nova (evangelho); Esse anúncio ou proclamação, nos escritos neotestamentários ficou conhecido como o “Kerygma” (em geral essa palavra em 1Cor vem traduzida em nossas bíblias apenas por “pregação”) e significa o anúncio do Cristo e de sua paixão morte e ressurreição. Paulo opõe o Kerygma (essa mensagem que está na origem da nossa fé) a dois comportamentos que procuram, um, garantias por meio de sinais e milagres e outro, as garantias por meio de doutrinas que satisfazem o pensamento (ver, ao final, uma reflexão dentro do nosso contexto contemporâneo).

Conforme a tipologia adotada, Paulo dirá que alguns consideram essa “linguagem da cruz” (verso 18) como “Moría” – termo grego que traduzimos por “asneira, tolice, bobagem, estupidez” (em geral nossas bíblias trazem o termo “loucura”). Outros a consideram como “Skándalon” – significa:: pedra de escândalo, obstáculo que faz tropeçar, ocasião de queda, laço, armadilha. Esse termo por sinal, permaneceu em nossa língua exatamente como em grego, ”Escândalo”, para o qual o dicionário Houaiss traz 5 acepções:

1) ato/acontecimento que contraria e ofende sentimentos, crenças ou convenções morais, sociais ou religiosas estabelecidas; 2) indignação ou sentimento de revolta – por ato que viola convenções morais; 3) aquilo que pode levar a erro, a mau procedimento ou a pecado; 4) ato que envolve desordem, tumulto, quebra de uma ordem estabelecida; 5) fato revoltante, inaceitável pela consciência civilizada.

Assim, – para os que gostariam de uma prova racional para a fé – aquilo que foi considerado como “estúpido, bobo, insensato” (“louco” ou “loucura”) se torna Sabedoria de Deus (cf.,verso 24)

Para os que procuram comprovação divina (manifestação, milagrosa, sinal da aprovação) aquilo que foi considerado “escândalo”, isto é, obstáculo ou pedra de tropeço que provoca a queda ou a indignação, se torna Poder de Deus (cf. ibidem).

O Kerygma é o anúncio de um Cristo (=um messias) crucificado (verso 23) que está a serviço de todos os grupos de pessoas (aqui sintetizados nos dois grupos conhecidos pelos coríntios e no seu tempo – “tanto Judeus como Gregos” – cf. verso 24).

É bom lembrar eu essas e outras passagens das epístolas foram muitas vezes usadas para acusar Paulo e o cristianismo de antissemitismo. No entanto são palavras do próprio Paulo:

Eu sou judeu, nasci em Tarso da Cilícia, mas criei-me nesta cidade, instruí-me aos pés de Gamaliel, em toda a observância da lei de nossos pais, partidário entusiasta da causa de Deus como todos vós também o sois no dia de hoje.(At22,3). Uma vez que se tornou cristão tornou-se entusiasta dessa salvação para todos que relativiza as situações históricas pessoais ou culturais:

Já não há judeu nem grego, nem escravo nem livre, nem homem nem mulher (Gal 3,28).

O silêncio da consciência cristã, por exemplo diante da Shoáh (nome mais apropriado do que “holocausto” e que indica a perseguição aos judeus, sobretudo no tempo do nazismo) deve-se a muitas razões. O teólogo J,-M. Garrigues lembra, um desses motivos: o fato de que a consciência cristã não dispunha de categorias religiosas nenhumas para pensar a identidade e a permanência dum povo de Israel, o qual continuasse caminhando na história ao seu lado, depois de Jesus. Com efeito, um antijudaísmo secular havia ocultado nos cristãos, por meio da afirmação duma substituição do povo judaico pela Igreja, o sentido da Escolha de Israel e a permanência deste depois de Jesus, a qual, sem embargo, Paulo afirma no Novo Testamento (Rm 11,28-29)" (Jean-Miguel Garrigues, La conscience religieuse chrétienne face à la Shoáh. Exposição no colóquio sobre a Shoáh em Tel Aviv, 24-26 de abril de 1995 -6 – o grifo é nosso).

Com efeito, assim como Paulo perseguiu os cristãos, houve também perseguição (de que Paulo participou antes de “cair do cavalo”) em relação aos cristãos, o que é lembrado por Paulo no acima citado trecho da carta aos Romanos:

No que se refere ao Evangelho, eles são inimigos, para proveito vosso (“diá hymâs” em grego) mas, quanto à eleição, eles são muito queridos por causa de seus pais (“diá tûs patéras”). Pois os dons e o chamado de Deus são irrevogáveis. (Rom 11,28-29, grifo nosso).

Portanto, poderíamos dizer – num certo sentido e procurando usar termos mais modernos – que o “Kerygma” (o anúncio a que se refere Paulo) não está prisioneiro do mundo da Religião em suas dimensões históricas, nem do mundo das ciências em seus métodos de procura da verdade. No texto de 1Coríntios (e em todo o contexto dessa e de outras cartas), os dois tipos de procura são indicados por Paulo por meio dos termos “os Judeus” e “os Gregos”. Esse vocabulário – para os cristãos de Corinto, seja para os de origem judaica seja para os de origem pagã, estrangeira ou romana – era bem compreensível e bem compreendido.

Apesar de nós, isto é: por mais que nossas religiões com todas as limitações humanas até de seus ministros e de nós mesmos, possam até empoeirar, ofuscar, complicar, empobrecer ou mesmo distorcer a mensagem de Deus; por mais que nossa visão às vezes se torne muito estreita, sectária ou carregada de preconceitos – mesmo assim Jesus Cristo, com sua cruz e ressurreição, constitui o núcleo da fé, manifestando esse Mistério de “poder e sabedoria de Deus”. Isso vem insistentemente repetido no texto de hoje (por ex., versos 18, 21,24, 25, 27, 30). A salvação e a fé continuam a ser oferecidas a todos, como aliás este Blog nos recorda em sua epígrafe:

“Glória a Deus no mais alto dos céus e na terra paz aos seres humanos, seus bem-amados” (Lc2,14) “e todos verão a salvação” (cf.Lc3,6) “aos (outros) povos foi enviada esta salvação, eles escutarão” (cf.At28,28).

O evangelho do dia traz hoje mais uma parábola diante do “atraso” do Senhor (Ele parece que nunca mais vai chegar...). Peçamos a graça do discernimento proposto por Paulo aos Coríntios para sermos como as jovens “sensatas” da parábola, atentos à palavra e à presença de Deus em todos os momentos da vida. Em geral – agarrados à nossa sabedoria (ou tradição, religião, certezas, etc.) – acabamos “adormecendo” sem ter as lâmpadas acesas na hora conveniente. Quem sabe, chegamos a nos considerar mais avançados, sábios e santos, do que Ele, sempre atrasado ...

( prof.FernandoSM, Rio, fesomor2@gmail.com )

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